sábado, 7 de fevereiro de 2015



CHEGADA DE RAUL SEIXAS AO CASTELO DE AVALON
 





Brilhava a lua cheia sobre o lago congelado de Avalon
Zunia o vento fustigando as garras fractais do arvoredo
Menestréis e neuromantes distraíam os convivas no salão
E na varanda um drúida recitava um cordel de Castañeda.
Era uma noite escura como as grutas de Sabá
e as fogueiras do castelo crepitavam sem parar...
A Távola Redonda celebrava o Ritual do Resplendor.
Dezesseis orientais, numa tela de cinema
começavam a traçar com hexagramas um teorema,
quando um calafrio de terror arrepiou o Rei Artur...
Alguém desconhecido se aproximava do portão
cantando feito um bêbado em dia de inundação
um rock do tipo “wo-bop-pa-baluba wop-bop bem-bum...”
E no meio da neve dos bosques os lobos uivavam:
- Rauuuuuullll...

O mago Merlin empunhou o seu binóculo.
O mago Crowley embainhou o seu punhal.
Os dragões do reino o cercaram. Os vídeo-monitores o focaram.
E ele rodeava a muralha do castelo dançando com a própria sombra
como um menino, ou como um velho;
e as imagens se alternavam nos monitores do salão
num arranjo serial da sua canção...
E ouvindo aquele bolero meio baião e meio blue,
O chinês Lao-Tsé e o judeu Leopold Bloom
discutiam quais as chances de sucesso de um filósofo zulu...
E no meio da neve do bosque os lobos uivavam:
- RauuuuuullllII...

Mas ele não gritava pras janelas, nem tocava no portão
puxava atrás de si, atada a cordas, uma carga de coisas...
E os Templários contemplaram numa tela de alta definição
a carga que o peregrino arrastava, no limite das forças...
A carroça de uns saltimbancos achada no chão de outro planeta;
um astrônomo caldeu manuseando uma luneta;
bailarinas metaleiras seduzindo a virgindade de um Xamã...
Ossadas de elefantes no cemitério dos automóveis;
um velho Dr. Frankenstein rodeado de monstros jovens
e o olho com a calma kamikaze de quem já foi no sertão...
O olho chamejante  de um alquimista tropical
que engoliu a semente do Fruto do Bem e do Mal
com um gole de Santo Daime
na taça do Santo Graal
em jejum...
E no meio da neve do bosque, os lobos uivavam:
- Rauuuulll...


Braulio Tavares in. O Homem Artificial. Rio de Janeiro: Sette Letras, 1999, pp. 62-63.


 
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