segunda-feira, 21 de maio de 2012

Vênus*

Cena do filme Vênus Negra (Vénus Noire), 2010

Foi arrancada da África do Sul e vendida em Londres.

E foi debochadamente batizada de Vênus dos Hotentotes.

Por dois xelins era possível vê-la, trancada numa jaula, nua, com suas tetas tão compridas que davam de mamar pelas costas. E pagando o dobro dava para tocar sua bunda, que era a maior do mundo.

Um cartaz explicava que aquela selvagem era metade humana e metade animal, a encarnação de tudo aquilo que os civilizados ingleses viram, felizmente, não são.

De Londres passou a Paris. Os especialistas do Museu de História Natural queriam averiguar se aquela Vênus pertencia a uma espécie localizada entre o homem e o orangotango.

Tinha vinte e poucos anos quando morreu. Georges Cuvier, célebre naturalista, fez a dissecação. Informou que ela tinha crânio de macaco, cérebro escasso e cu de mandril.

Cuvier desprendeu os lábios da vagina, penduricalho enorme, e meteu-os num frasco.

Dois séculos depois, o frasco ainda estava sendo exibido, em Paris, no Museu do Homem, junto dos genitais de outra africana e de uma índia peruana.

Bem pertinho estava, em outra série de frascos, os cérebros de alguns cientistas europeus.


Eduardo Galeano. in. Espelhos. Ed. L&PM, 2009, pp. 194-195.


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