(...) como a maioria das inscrições romanas, o
poema não tinha pontuação nem parágrafos ou espaços entre as palavras. As
unidades de som e de sentido estavam provavelmente mais próximas dos ritmos da
fala que das unidades tipográficas (...) da página impressa. A própria página
como unidade do livro data apenas do século III ou IV d.C. Antes disso, para
ler um livro, era preciso desenrolá-lo. Depois que as páginas reunidas (o
codex) substituíram o rolo (volumem), os leitores podiam ir e voltar com mais
facilidade ao longo dos livros, e os textos passaram a ser divididos em
segmentos que podiam ser destacados e postos em índices. Mas, mesmo depois de
os livros terem adquirido sua forma moderna, por muito tempo a leitura
continuou a ser uma experiência oral, desempenhada em público. Em algum momento
indeterminado, talvez em alguns mosteiros no século VII e seguramente nas
universidades do século XIII, as pessoas começaram a ler sozinhas em silêncio.
É possível que a passagem para a leitura silenciosa tenha implicado uma maior
adaptação mental do que a passagem para o texto impresso, pois ela fazia da
leitura uma experiência individual e interior.
A impressão fez alguma diferença, é claro, mas
provavelmente menos revolucionária do que geralmente se imagina. Alguns livros
tinham frontispícios, índices de conteúdo, índices remissivos, paginação e
editores que faziam muitas cópias nos “scriptoria” para um grande público
leitor, antes da invenção do tipo móvel. Nos primeiros cinquenta anos de sua
existência, o livro impresso continua a ser uma imitação do livro manuscrito.
Não há duvida de que era lido pelo mesmo público e da mesma maneira. Mas, a
partir de 1500, o livro, o panfleto, o folheto, o mapa e o cartaz impressos
começaram a atingir novos tipos de leitores e a estimular novos tipos de
leitura. Com um formato cada vez mais padronizado, um preço cada vez mais
barato e uma distribuição mais ampla, o novo livro transformou o mundo. Não se
limitava a fornecer mais informações. Proporcionava um tipo de compreensão, uma
metáfora fundamental para entender a vida.
Foi assim que, no século XVI, as pessoas tomaram
posse do Verbo, no século XVII começaram a decodificar o “livro da natureza”, e
no século XVIII aprenderam a ler a si mesmas.
*Robert Darnton in. “O beijo de Lamourette”. Ed.
Companhia das Letras, 2010, pp. 199-200.
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La Liseuse, c. 1845-1850
Huile sur toile, 42,5 x 32,5 cm
Huile sur toile, 42,5 x 32,5 cm
Jean-Baptiste Camille Corot (1796-1875)
Zurich, Fondation Collection E.G. Bührle
Zurich, Fondation Collection E.G. Bührle