Não é possível fazer uma reflexão sobre o que é a educação sem refletir sobre o próprio homem.
Por isso, é preciso fazer um estudo filosófico-antropológico. Comecemos por pensar sobre nós mesmos e tratemos de encontrar, na natureza do homem, algo que possa constituir o núcleo fundamental onde se sustente o processo de educação.
Qual seria este núcleo captável a partir de nossa própria experiência existencial?
Este núcleo seria o inacabamento ou a inconclusão do homem.
O cão e a árvore também são inacabados, mas o homem se sabe inacabado e por isso se educa. Não haveria educação se o homem fosse um ser acabado. O homem pergunta-se: quem sou? de onde venho? onde posso estar? O homem pode refletir sobre si mesmo e colocar-se num determinado momento, numa certa realidade: é um ser na busca constante do ser mais e, como pode fazer esta auto-reflexão, pode descobrir-se como um ser inacabado, que está em constante busca. Eis aqui a raiz da educação.
A educação é uma resposta da finitude à infinitude. A educação é possível para o homem, porque este é inacabado e sabe-se inacabado. Isto leva-o à sua perfeição. A educação, portanto, implica uma busca realizada por um sujeito que é homem. O homem deve ser o sujeito de sua própria educação. Não pode ser o objeto dela. Por isso, ninguém educa ninguém.
Por outro lado, a busca deve ser algo e deve traduzir-se em ser mais: é uma busca permanente de "si mesmo" (eu não posso pretender que meu filho seja mais em minha busca e não na dele).
Sem dúvida, ninguém pode buscar na exclusividade, individualmente. Esta busca solitária poderia traduzir-se em um ter mais, que é uma forma de ser menos. Esta busca deve ser feita com outros seres humanos que também procuram ser mais e em comunhão com outras consciências, caso contrário se faria de umas consciências, objetos de outra. Seria "coisificar" as consciências.
Jaspers disse: "Eu sou na medida em que os outros também são."
O homem não é uma ilha. É comunicação. Logo, há uma estreita relação entre comunhão e busca.
[Fragmento].
Paulo Freire. in. "Educação e Mudança". Ed. Paz & Terra, 1982. pp. 27-28.
Nota do Blog: Esse fragmento é só um aperitivo de um texto importante para o Educador e para aqueles que acreditam em um modelo de educação crítica, em que tanto professores quanto alunos devam atuar enquanto sujeitos de sua própria realidade com vias a transformá-la para melhor. Sugerimos a leitura completa do texto que se encontra na seguinte referência: FREIRE, Paulo. A Educação e o Processo de Mudança Social. In. _____. Educação e Mudança. Rio de Janeiro: Paz & Terra, 1982. pp. 27 - 41.