quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Rio pela janela*



Por Leandro da Silva Martinho

Já se tornou comum falar que o Rio de Janeiro está de braços abertos para receber todos que decidam conhecer esse estado maravilhoso. Porém, está de braços abertos para o mundo e de costas para o seu povo.
O cenário, palco de grandes eventos, está em construção, tira-se o “lixo” urbano, faz-se um cinturão de contenção, com diria Slavoj Zizek: “as novas formas de apartheid, os novos muros e as favelas”, tudo é feito para que a transmissão em TV digital esteja perfeita e não mostre “os pés de galinha” do rosto de nosso estado.
 As vias de trânsito ganham muros, ou telas, com desenhos, que maquiam a realidade das casas humildes, enquanto isso, doentes morrem sem leitos suficientes nos hospitais com suas pinturas sóbrias e mediavais, fazendo dos médicos artistas.
Certamente, os hospitais a serem reformados para os grandes eventos, serão os que circundam os espaços freqüentados por turistas.
Ademais, o Sociólogo Anthony Giddens, em seu livro “Sociologia”, lembra da teoria “das janelas quebradas”, segundo esta teoria há uma conexão direta entre a aparência de desordem e o crime efetivo. Tal teoria abre espaço para os programas de tolerância zero aplicados pela polícia, e uma das críticas, é justamente deixar a critério dos policiais a identificação da desordem, nesse momento, invoca-se Cesare Lombroso e sua assombrosa teoria, adaptada à realidade tupiniquim, com a verificação da deformidade do bolso.
Portanto, Não há espaço no Rio para os que vivem à margem, proíbem-se festas de aniversários nas favelas, controlam-se movimentos culturais do “Silva” pobre, assim como era feito com o samba, o importante é que tudo tenha a aparência de lugar paradisíaco.
Exalta-se, ainda, o pandeiro da mulata, o teleférico periférico, o zoológico humano e o turismo feito como um safári em favelas.
No entanto, o passista está sempre sorrindo, pois em sua vida o valor é a ginga, o molejo, e a Lua que ilumina com alegria a simples felicidade.
Por tudo isso, é de se contemplar o maravilhoso cenário do pobre carioca com sua rica alma ferida, enjaulado, cercado por barras de ferro invisíveis, pelo medo, pelo cerceamento do direito de se divertir, sendo recolhido como uma célula cancerígena.
E para não perder a oportunidade, vendem-se bonecos de super-homens! Os espectadores aplaudem mais um filme de terror humanitário, e todo mundo vai dormir feliz, sonhando com o trânsito caótico e a próxima vitória no apertado estádio de futebol.
Para finalizar, cito o poeta: “Brasil, mostra a sua cara!”, mas sem maquiagem é melhor! Que se mude a realidade, que se combata a causa, para não se obrigar a aniquilar os efeitos. Que se revolucione democraticamente a Justiça, como propõe Boaventura Souza Santos, que se revolucione a educação trazendo de volta a concepção de Darcy Ribeiro, que se construa um programa amplo e eficaz de saúde da família. Que se respeite, realmente, o princípio constitucional de Dignidade da Pessoa Humana.

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* O Brasil pra “gringo” ver está ai, quer dizer, não está, mas é como se estivesse. O “Brazil gringo”, o Brazil com "Z", é um milagre da propaganda, é um túmulo caiado pela mão de marqueteiros profissionais e oficiais. Rock in Rio, Copa do Mundo, Olimpíadas (só para ficar nos grandes eventos) mostram os abismos entre o “Brazil editado” e o “Brasil de fato”. 
Este texto de Leandro da Silva Martinho foi certeiro ao apontar a verdadeira engenharia por trás destes eventos. Quem foi que disse que a Copa do Mundo ou as Olimpíadas serão eventos para brasileiros? Ora, se até já se discute no Congresso uma lei que joga no lixo os direitos adquiridos por estudantes (meia-entrada) e idosos (entrada-livre) que porventura “sonhem” em participar destes eventos. Com certeza,  o “melhor” lugar que o “brasileiro de fato” irá ocupar para assistir tais espetáculos será diante da TV, ouvindo as pérolas e filosofias do escalafobético Galvão Bueno.
As cidades que irão sediar os jogos ou servir de alojamento à “gringalhada” já passam por “reformas” (eufemismo hipócrita) embelezadoras, ou seja, escondem os pobres da lente curiosa dos turistas e dos enxeridos jornalistas estrangeiros, “pacificam” à bala as favelas, vendem o carnaval (a mulata vem como brinde) e o futebol como “coisa nossa”, criam uns numerozinhos positivos e treinam o sorriso, dizem eles, “mostrem todos os dentes possíveis para verem como somos felizes, como Deus realmente é Brasileiro.”  Enquanto isso, o Povão que se Lasque!!! Que suma da paisagem!!! Que vá pra bem longe do espetáculo!!! Ah! Mas que não esqueça de pagar a Conta. Que vai ser cara? Vai. Mas é para o bem do “Brazil”!!!

Por Josenias Silva


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