Pensem
os fisiologistas como quiserem, o pé é a parte mais distinta do corpo humano;
sem ele a estatura não teria a nobreza que Deus só concedeu à criatura
racional.
O
pé revela o caráter, a raça e a educação. Cada uma das feições e dos gestos
desse órgão de nossa vontade tem uma expressão eloqüente. Há quem não adivinhe
em um pé delicado e nervoso a alma de fina têmpera? Ao contrário, um pé chato e
pesado é a prova infalível de um gênio tardo e pachorrento.
Vergílio,
o poeta mais elegante que tem existido, compreendeu que Vênus ocultasse nos
olhos do filho, na selva líbica, a beleza imortal de seus olhos, de seu sorriso,
de suas formas sedutoras; mas não aquilo que era sua essência divina, sua graça
olímpica. Foi pelo andar que ela revelou-se deusa; et vera incessu patuit dea.
Nunca
sentiste o doce contato do pé da mulher amada? É uma sensação deliciosa que
penetra no seio d’alma.
[...]
Apaixonei-me
por esse pezinho, que eu nunca vira, que não conhecia. Sagrei-lhe minha alma
como ao ignoto deo de minhas adorações.
(Fragmento).
José
de Alencar. in. A Pata da Gazela.
Ed. Ática, 1999.