sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Da Solidão*



“É preciso ter, se possível, mulher, filhos, fortuna e principalmente saúde, mas não se prender a isso a ponto de prejudicar nossa felicidade. É preciso ter como reserva um recanto pessoal, independente, em que sejamos livres em toda a acepção da palavra, que seja nosso principal retiro e onde estejamos absolutamente sozinhos. Aí nos entreteremos de nós com nós mesmos, e a essa conversa, que não versará nenhum outro assunto, ninguém será admitido. Aí nos abandonaremos a nossos pensamentos sérios ou divertidos, como se não tivéssemos mulher nem filhos, nem bens, nem casa, nem criadagem, de maneira que se algum dia eles nos faltarem não nos custe demasiado a carência.

É preciso romper com quaisquer obrigações imperativas. Talvez ainda gostemos disto ou daquilo, mas só a nós mesmos poderemos desposar. Em outras palavras, o que está fora de nós pode não nos ser indiferente, mas não a ponto de se colar a nós de modo que não se arranque sem nos esfolar e sem levar alguma parcela de nós. A coisa mais importante do mundo é saber pertencer-nos.”


Michel de Montaigne in. “Ensaios”. Ed. Abril Cultural, 1980. p.116.

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