Mais do que contabilizar os números trágicos da
violência urbana e/ou da onda de medo pulverizada pela mídia, precisamos de
poesia, mesmo que seja para constatar o presente. Leia abaixo algo que W.
Bonner poderia "noticiar" no seu JN.
Provisoriamente não
cantaremos o amor,
que se refugiou mais
abaixo dos subterrâneos.
Cantaremos o medo, que
esteriliza os abraços,
não cantaremos o ódio,
porque este não existe,
existe apenas o medo,
nosso pai e nosso companheiro,
o medo grande dos
sertões, dos mares, dos desertos,
o medo dos soldados, o
medo das mães, o medo das igrejas,
cantaremos o medo dos
ditadores, o medo dos democratas,
cantaremos o medo da
morte e o medo de depois da morte.
Depois morreremos de
medo
e sobre nossos túmulos
nascerão flores amarelas e medrosas.
Carlos Drummond de
Andrade in. “Obra completa” Ed. José
Aguilar, 1967, p.105.