Por que gostamos do outro? Convivemos,
cotidianamente. Quando nos sentimos isolados alguma coisa parece quebrada. O
silêncio faz bem, traz sossego, mas é importante não diluir as sociabilidades.
Não gostamos de todo mundo. Seria impossível. Há pessoas que desmancham
prazeres com ironias e arrogâncias. Freud explica. Posso ser simpático para
muitos companheiros, sem agradar aos que estão próximos no trabalho. É difícil
calcular a medida. O que atrai o afeto, o que deixa seguro, o que nos encanta?
Construir uma classificação de valores é tarefa inútil. Não dispensamos,
contudo, as diferenças. Não é a proximidade e o cuidado que, fatalmente, nos
farão felizes.
Muita gente no mundo não tem solucionado o problema
da solidão. As moradias estreitas, sem ares de aconchego, incomodam. As ruas
cheias de ruídos, agressividades gratuitas, irritam. A arte do encontro é
repleta de energias indecifráveis. Há amizades que se desfazem depois de anos,
sem guardar vestígios. Há paixões que duram uma semana e alteram o cotidiano
radicalmente. O sentimento não descansa. É preciso não anular as atenções,
falar com estranhos, viajar por territórios desconhecidos. Prolongar o amor é o
desejo da maioria. No entanto, o descartável é feroz. Não está, apenas, no
consumo, segue pela história.
Somos
animais sociais. Não vejo como duvidar disso. Por que as escolhas, por que uns
desagradem, outros enternecem? Mesmo nas redes sociais, onde a virtualidade
prospera, não fugimos das buscas. Não curtimos tudo ou exercemos o
compartilhamento com apenas certas figuras. Há grupos fechados, antipatias
implícitas, má vontade em responder. A multiplicidade de ações é
incomensurável. Mas navegar no facebook é prova de que a sociabilidade possui
outras atmosferas. Somos surpreendidos por reações. Muitas vezes, desistimos de
persistir com diálogos. Não tem razão cartesiana que esgote as ansiedades que
surgem nos momentos de dúvida.
Cada sociedade cultiva seus hábitos. Eles têm mudado
com a velocidade da tecnologia. Ninguém consegue se esconder dos estragos que
fazem um telefone celular ou alguém que estica sua curiosidade nos papos pela
internet. Os interesses variam. Os telefones fixos perderam sua soberania.
Pesam, servem como peças de ornamentação. Não vendo as imagens dos amigos
virtuais atiçamos desejos e idealizações. Muitos planejam casamentos, tardes em
cafés, abraços envolventes, soluções imediatas para o desconforto
afetivo. Não faltam decepções. Elas ocorrem, pois não há milagres, nem códigos que
nos salvem de tudo.
Os desenganos não acabam com as tentativas. Quem
conhece outras alternativas sente nostalgias do escurinho do cinema, joga
fora a tristeza, volta para aventuras mais antigas. Quem está entrando nas
novidades com ares sedutores pode escorregar e maldizer a inexperiência. A vida
não perde seu ritmo de jogo, pois é preciso abalar a mesmice, arriscar.
Reservar-se sempre ou considerar-se senhor das verdades afasta redefinições,
firma esconderijos melancólicos. As perdas estão nas regras do jogo, como a
leveza no voo do tapete mágico. Não adiantar excessos. Eles agitam
incertezas. O bom é o gostar que chega, sem muita vacilações, acariciado pelo
inesperado. Muita objetividade é sinal de desamores mascarados.
Antonio
Rezende in. Astúcias de Ulisses