terça-feira, 27 de setembro de 2011

Procure o Carlos*



Consolo na praia


Vamos, não chores...
A infância está perdida.
A mocidade está perdida.
Mas a vida não se perdeu.

O primeiro amor passou.
O segundo amor passou.
O terceiro amor passou.
Mas o coração continua.

Perdeste o melhor amigo.
Não tentaste qualquer viagem.
Não possuis carro, navio, terra.
Mas tens um cão.

Algumas palavras duras,
em voz mansa, te golpearam.
Nunca, nunca cicatrizam.
Mas, e o humour?

A injustiça não se resolve.
À sombra do mundo errado
murmuraste um protesto tímido.
Mas virão outros.

Tudo somado, devias
precipitar-te, de vez, nas águas.
Estás nu na areia, no vento…
Dorme, meu filho.

Carlos Drummond de Andrade, A Rosa do Povo, 1989.

___________
*Quem foi que disse que o poeta não pode fazer as vezes de um psicólogo, confidente, doutor da “alma”? Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) fala dessas coisas de amor e sofrimento, dá conselhos, ouve queixas e, como se pôde ver na imagem acima, atende gratuitamente em um dos bancos do calçadão de Copacabana. Um poeta/psicólogo do povo, sempre solicito e disposto a ouvir seus dramas, sua história, seus planos. Bateu a “deprê”, a solidão, o desespero? Procure o Carlos, ele ajuda.

Por Josenias Silva
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