Vamos, não chores...
A infância está perdida.
A mocidade está perdida.
Mas a vida não se perdeu.
A infância está perdida.
A mocidade está perdida.
Mas a vida não se perdeu.
O primeiro amor passou.
O segundo amor passou.
O terceiro amor passou.
Mas o coração continua.
O segundo amor passou.
O terceiro amor passou.
Mas o coração continua.
Perdeste o melhor amigo.
Não tentaste qualquer viagem.
Não possuis carro, navio, terra.
Mas tens um cão.
Não tentaste qualquer viagem.
Não possuis carro, navio, terra.
Mas tens um cão.
Algumas palavras duras,
em voz mansa, te golpearam.
Nunca, nunca cicatrizam.
Mas, e o humour?
em voz mansa, te golpearam.
Nunca, nunca cicatrizam.
Mas, e o humour?
A injustiça não se resolve.
À sombra do mundo errado
murmuraste um protesto tímido.
Mas virão outros.
À sombra do mundo errado
murmuraste um protesto tímido.
Mas virão outros.
Tudo somado, devias
precipitar-te, de vez, nas águas.
Estás nu na areia, no vento…
Dorme, meu filho.
precipitar-te, de vez, nas águas.
Estás nu na areia, no vento…
Dorme, meu filho.
Carlos Drummond de Andrade, A Rosa do Povo, 1989.
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*Quem foi que disse que o poeta não pode fazer as vezes de um psicólogo, confidente, doutor da “alma”? Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) fala dessas coisas de amor e sofrimento, dá conselhos, ouve queixas e, como se pôde ver na imagem acima, atende gratuitamente em um dos bancos do calçadão de Copacabana. Um poeta/psicólogo do povo, sempre solicito e disposto a ouvir seus dramas, sua história, seus planos. Bateu a “deprê”, a solidão, o desespero? Procure o Carlos, ele ajuda.
Por Josenias Silva