Por PABLO NERUDA
LXVIII
A menina de madeira não chegou caminhando:
ali esteve de súbito sentada nos ladrilhos,
velhas flores do mar cobriam sua cabeça,
seu olhar tinha tristeza de raízes.
Ali ficou olhando nossas vidas abertas,
o ir e ser e andar e voltar pela terra,
o dia descolorindo suas pétalas graduais.
Vigiava sem ver-nos a menina de madeira.
A menina coroada pelas antigas ondas
ali fitava com seus olhos derrotados:
sabia que vivemos numa rede remota
de tempo e água e ondas e sons e chuva,
sem saber se existimos ou se somos seu sonho.
Esta é a história da moça de madeira.
Pablo Neruda, Cem sonetos de amor, 1979.
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*Pablo Neruda (1904-1973), poeta chileno.