sábado, 10 de março de 2012

A fronteira*



Por Milan Kundera



Já era noite alta; eles estavam em casa de Edwige, e uma garrafa de uísque esvaziada pela metade estava diante deles sobre uma mesa baixa.

– O que você quer dizer com isso? – perguntou ela.

– Quero dizer que – respondeu Jan –, quando um homem e uma mulher fazem a mesma coisa, não é a mesma coisa. O homem violenta, a mulher castra.

– Você quer dizer com isso que é feio castrar um homem, mas que é uma bela coisa violentar uma mulher.

– Com isso, quero dizer apenas que – replicou Jan – a violação faz parte do erotismo, mas que a castração é sua negação.

Edwige esvaziou seu copo de um só gole e respondeu, encolerizada:

– Se a violação faz parte do erotismo, isso quer dizer que todo o erotismo é dirigido contra a mulher e que é preciso, portanto, inventar outro.


[fragmento]


in. O livro do riso e do esquecimento, 1990, p.198.

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