A resposta é sim se
comungamos essa angústia, essa frustração frente aos sonhos idílicos da
modernidade. Quem diria que a revolução russa terminaria em gulags, a chinesa
em capitalismo de Estado e tantos partidos de esquerda assumiriam o poder como
o violinista que pega o instrumento com a esquerda e toca com a direita?
Nenhum sistema
filosófico resiste, hoje, à mercantilização da sociedade: a arte virou moda; a
moda, improviso; o improviso, esperteza. As transgressões já não são exceções,
e sim regras. O avanço da tecnologia, da informatização, da robótica, a
gloogletização da cultura, a telecelularização das relações humanas, a
banalização da violência, são fatores que nos mergulham em atitudes e formas de
pensar pessimistas e provocadoras, anárquicas e conservadoras.
Na pós-modernidade,
o sistemático cede lugar ao fragmentário, o homogêneo ao plural, a teoria ao
experimental. A razão delira, fantasia-se de cínica, baila ao ritmo dos jogos
de linguagem. Nesse mar revolto, muitos se apegam às
"irracionalidades" do passado, à religiosidade sem teologia, à
xenofobia, ao consumismo desenfreado, às emoções sem perspectivas.
Para os pós-modernos
a história findou, o lazer se reduz ao hedonismo, a filosofia a um conjunto de
perguntas sem respostas. O que importa é a novidade. Já não se percebe a
distinção entre urgente e importante, acidental e essencial, valores e
oportunidades, efêmero e permanente.
A estética se faz
esteticismo; importa o adorno, a moldura, e não a profundidade ou o conteúdo. O
pós-moderno é refém da exteriorização e dos estereótipos. Para ele, o agora é
mais importante que o depois.
Para o pós-moderno,
a razão vira racionalização, já não há pensamento crítico; ele prefere, neste
mundo conflitivo, ser espectador e não protagonista, observador e não
participante, público e não ator.
O pós-moderno duvida
de tudo. É cartesianamente ortodoxo. Por isso não crê em algo ou em alguém.
Distancia-se da razão crítica criticando-a. Como a serpente Uroboros, ele morde
a própria cauda. E se refugia no individualismo narcísico. Basta-se a si mesmo,
indiferente à dimensão social da existência.
O pós-moderno tudo
desconstrói. Seus postulados são ambíguos, desprovidos de raízes,
invertebrados, sensitivos e apáticos. Ao jornalismo, prefere o shownalismo.
O discurso
pós-moderno é labiríntico, descarta paradigmas e grandes narrativas, e em sua
bagagem cultural coloca no mesmo patamar Portinari e Felipe Massa; Guimarães
Rosa e Paulo Coelho; Chico Buarque e Zeca Pagodinho.
O pós-modernismo não
tem memória, abomina o ritual, o litúrgico, o mistério. Como considera toda
paixão inútil, nem ri nem chora. Não há amor, há empatias. Sua visão de mundo
deriva de cada subjetividade.
A ética da
pós-modernidade detesta princípios universais. É a ética de ocasião,
oportunidade, conveniência. Camaleônica, adapta-se a cada situação.
A pós-modernidade
transforma a realidade em ficção e nos remete à caverna de Platão, onde nossas
sombras têm mais importância que o nosso ser e as nossas imagens que a
existência real.
Frei Betto. in. Correio da Cidadania